O Transe Mediúnico
Se você
olhar nos dicionários o significado da palavra transe, encontrará, entre outras definições, “momento critico,
crise, momento aflitivo". Mas o dicionário "Aurélio" coloca
também: “estado de médium ao manifestar-se nele o espírito”, o que dá uma ideia
de que o médium está num estado especial quando ocorre a comunicação mediúnica.
Pode-se dizer que esta ideia é correta.
Allan
Kardec, em "O Livro dos Médiuns", capítulo 19, refere-se a esse estado
especial, numa pergunta sobre o assunto, tendo os Instrutores Espirituais
respondido que o médium, no momento da manifestação do espírito, está "num
estado mais ou menos acentuado de crise", conforme a linguagem própria do
século XIX.
Na
atualidade, chamamos de transe esse estado que caracteriza o instante da
comunicação de um espírito.
Mas o que
significa este termo? Genericamente define-se transe como um estado alterado de
consciência.
Jayme
Cervino, no livro “Além do Inconsciente” (1) esclarece que “a
interiorização da consciência é o aspecto básico do transe". Neste há “um
estado de baixa tensão psíquica".
Assim,
chegamos ao ponto capital deste tema, o transe mediúnico, que é um estado
alterado de consciência do Médium, que possibilita a expansão do seu
períspirito, para que ocorra a necessária sintonia e imantação com o espírito
que deseja comunicar-se.
O transe
mediúnico não deve ser confundido com estados patológicos, tais como o
"estado crepuscular" dos histéricos e epilépticos. Em casos de traumatismos
crânio-encefálicos, delírio febril, estado de coma, pode surgir, eventualmente,
o transe, mas que em nada se relaciona com o de caráter mediúnico.
O transe
pode ser superficial ou profundo, dependendo do gênero de mediunidade que a
pessoa apresenta; deve-se levar em conta, ainda que, para a sintonia com
determinados espíritos, é imprescindível um transe mais profundo, de acordo com
o tipo de mensagem a ser transmitida.
No transe
superficial, a pessoa não perde a consciência e sabe o que lhe está ocorrendo;
no transe profundo (também chamado de sonambúlico) o médium fica inconsciente
e, ao terminar a mensagem do espírito comunicante não se recorda do seu
conteúdo e do que lhe ocorreu.
Compreende-se
que existem muitas gradações nestes dois tipos de transe.
Existe
ainda um outro tipo de transe, que é o anímico - ou seja, provocado pelo
espírito do próprio médium, sem que haja intervenção de um espírito
desencarnado. Este estado acontece pela propriedade de expansão do períspirito,
é o que o Dr. Gustave Geley denomina de descentralização.
Vejamos como ele define o médium:
"O
médium e um ser cujos elementos constitutivos (mentais, dinâmicos, materiais)
são suscetíveis de descentralização momentânea".
Ele
acrescenta que essa tendência inata para a descentralização é reforçada e
facilitada pela prática da mediunidade. (2)
Um dos
exemplos mais significativos do estado de transe, mostrando a suas diferentes
gradações e amplas possibilidades de desdobramento, é o do célebre médium
mineiro, da cidade de Sacramento, Eurípedes Barsanulfo.
Eurípedes
Barsanulfo (O1/05/1880 / 01/11/1918), espírito de escol, inteligência
brilhantíssima, professor, educador, conhecido e amado no meio espírita pela
sua vida missionaria, teve uma infância pobre, numa família numerosa, tendo
professado a religião católica até a idade de 24 anos. Desde cedo distinguiu-se
por sua dedicação ao estudo, por sua conduta equilibrada e seu acentuado amor
às criaturas, em especial aquelas mais carentes. Sua atenção para o Espiritismo
foi despertada quando teve o ensejo de ler um dos maiores clássicos da
literatura espírita, O livro Léon Denis, “Depois da Morte”, pois nele encontrou
as respostas aos seus questionamentos para os quais os conceitos católicos não
tinham explicações. A partir desse momento, começou a ler as obras doutrinárias
e, ao mesmo tempo, interessou-se em assistir uma reunião mediúnica, realizada
numa fazenda das proximidades, para a qual foi convidado pelo tio Mariano da
Cunha.
A
primeira reunião mediúnica assistida por Eurípedes Barsanulfo, foi decisiva,
pois encontrou ali a comprovação daquilo que teoricamente fora informado ou
pressentia, intuitivamente. Embora os participantes do grupo fossem pessoas de
nível intelectual muito abaixo do de Eurípedes, as comunicações que assistiu
tinham surpreendente conteúdo filosófico e espiritual, atestando a
autenticidade das mesmas. Mentalmente, ele fez um pedido, que foi respondido
por um Espírito de Luz, em forma de uma belíssima mensagem, transmitida por um
homem do campo. (3)
Fiel aos
seus princípios de dignidade e honestidade, ele comunicou às autoridades
eclesiásticas locais a sua conversão ao Espiritismo, visto que exercia vários
cargos de projeção na comunidade, sendo que a notícia repercutiu como um
impacto enorme, pois o jovem Barsanulfo era considerado a revelação mais
promissora de Sacramento. Imaginemos isto nos primeiros anos deste século. Como
não podia deixar de acontecer, sofreu perseguições e humilhações, até que sua
grandiosa e meritória obra fosse reconhecida.
A mediunidade
de Eurípedes eclodiu de forma notável, espontânea e multiforme, como só
acontece com espíritos adredemente preparados para isto e que tenham uma missão especial como foi a
dele. Desdobramento, vidência, psicofonia, psicografia, curas, efeitos físicos,
receituário foram surgindo e se tornando habituais em sua vivência.
Professor
e educador, Eurípedes fundou o Colégio “Allan Kardec", que até hoje existe
em Sacramento, nele lecionando as mais diversas matérias, pois, sendo uma
inteligência invulgar, dominava perfeitamente os mais diversos ramos do
conhecimento humano. Fundou também o Grupo Espírita "Esperança e
Caridade".
A
capacidade de desdobramento era tão comum em sua vida, que atendia enfermos que
se encontravam em outros locais, entrando em transe e indo em espírito aonde
estes se encontravam e, não raro, o seu períspirito tornava-se Visível aos que
estivessem presentes, enquanto o seu corpo físico estava em outro ambiente
também visível aos que ali estivessem. (4) Isto acontecia até na
sala de aula, quando havia urgente necessidade de atender a uma pessoa
gravemente doente, em perigo de vida. Eurípedes era convocado pelos Mentores
Espirituais para atendê-las, neste processo de desdobramento. Os alunos
habituaram-se a este incomum atendimento e, quando notavam que o professor, de
repente, se tornava meio paralisado, diziam entre si: - “Seu Eurípedes já
foi!..."
Por
ocasião da grande epidemia de gripe denominada “espanhola”, que vitimou
milhares de pessoas no País, Eurípedes dedicou-se a atender aos enfermos,
passando noites em claro ao lado de seus leitos, sem tempo para dormir ou
cuidar de si, o que acabou por levá-lo a contrair a doença, vindo a desencarnar
em poucos dias, por estar com a saúde já debilitada em virtude da constante
doação em favor das criaturas, sem tempo para resguardar-se de forma mais
eficiente.
Tantos
foram os benefícios prestados por Eurípedes Barsanulfo, que em Sacramento há
uma atmosfera diferente, pois seus parentes e seguidores souberam manter a sua
obra, ampliando-a, inclusive, com os recursos modernos e preservando a sua
memória com amor e dedicação. Atualmente, este espírito luminar é um dos
Instrutores Espirituais do Movimento Espírita, prosseguindo com o seu trabalho
de socorro às criaturas humanas.
(1)
CERVINO. Jayme – “Além do Inconsciente" - 2a ed. - FEB.
(2)
GELEY. Gustave - "Resumo da Doutrina Espírita" -2a
ed. - LAKE.
(3)
Dados extraídos do livro de Corina Novelino, "Eurípedes, O Homem e a
Missão" - 1a ed. - IDE.
(4)
Este tipo de mediunidade denomina-se bicorporeidade. Maiores detalhes em
"O Livro dos Médiuns".
A vida de Eurípedes Barsanulfo motiva-me a
prosseguir na minha singela tarefa mediúnica. Sei que devo dedicar-me cada vez
mais, a fim de exercitar as potencialidades que me são próprias que, por certo,
com o tempo e o burilamento constante, poderão um dia fulgir como um sol,
iluminando de bênçãos a minha vida.
Livro Mediunidade: Caminho Para Ser Feliz - Suely Caldas Schubert